Parecia absurdo, mas lá estava aquele homem de meia idade, sentado ao canto do salão, reconstado na parede. Cabeça vagando, olhos girando, cara de bobo. Quiseram expulsá-lo da reunião. Ele e seu riso sarcástico, no canto da boca, debochado. Paula intercedeu por ele e seu esposo, Dr. Alberto, lhe deu apoio. João, a muito custo, concordou. Posicionou-se ao lado do meliante, porém, num olhar extremamente ameaçador.
Conheço bem o sujeito – dizia o português com o olhar espichado. Fica na portaria o dia inteiro, babando na mulher dos outros, até o dia em que acordar com a boca cheia de formiga. Eu vejo como ele olha para cada esposa que adentra aqui o recinto – explicou para a Dr. Alberto que lhe continha.
Ao longe, Zezinho confidente e amigo, apenas observava a reunião que prometia ser uma das melhores. Logo, a ninfa do 504 apareceu. Vestido de tecido, fino e estampado. Borda acima do joelho, mamilos aparecendo. Costas nuas e bronzeadas. Calcinha mínima, enfiada. Mas não era vulgar, defendia Laerte. Zezinho balançava a cabeça e dizia: Nosssssssssssssa!
Dona Clotilde fez sinal com a mão e seu Aurélio calou-se. Também, com aquele tamanhão! Durante o dia, rolo de macarrão à mão. À noite, coleira e chicote. O pobre homem devia de sofrer. Um dia, bateu a porta de seu Laerte e lhe mostrou uma guimba de cigarros. Laerte pensou naquilo por noites, enquanto Zezinho apenas dizia: Nosssssssssssssa!
Laerte desejava mesmo Eulália. Que mulher! Criou três filhos, sozinha, no laço. Seis da manhã, já de pé. Pickup na rua. Filhos de unifrome, squeeze e malha apertada de academia. Voltava por volta das sete. Meia-hora passava e, que transformação! Tailler na cor rosa, escuro. Pastinha no braço, cabelos devidamente presos e decotes charmosos e comportados. À noite, dava aulas de ginástica no salão do prédio, e comandava, aos berros, seus alunos. Seu Laerte nunca gostou de fazer exercícios, mas com Eulária, como dizia Zezinho, nosssssssssa!
Mariza era do tipo recatada e Laerte adorava mulher “fiel”. Teve um flerte com uma amiga do trabalho. Vinte anos de casada, manhãs de domingo na igreja, almoço na sogra. Levava e buscava os filhos no colégio e quando um deles tinha febre, faltava. A melhor transa de sua vida – disse ele para Zezinho, nosssssssssssssa!
O apartamento 203 foi ocupado recentemente por Odete. Mulata “tipo exportação” comentou com Zezinho. Descia todos os dias, duas da manhã para vê-la chegar. Sapatos plataforma, dourados, brilhantes. Calças em sarja, cumpridas e suadas. Pele brilhante e um sorriso daqueles bem feliz, de verdade – Imagina essa mulher bêbada, Zezinho! Nosssssssssa!
A coisa esquentou no salão, dona Marlene estava exaltada e a ninfa do 504 jogava as pernas de um lado para o outro. Ouviu Sr. Glauco do 302, com os olhos raivosos, lhe indagar alguma coisa que ousou não perguntar. Balançou a cabeça, franziu a testa e concordou. Concordou com tudo, até ver Marília. A moça era simpática, atenciosa e tinha uma voz de quem parece estar incessantemente tendo orgasmos. Sorria com os olhos e com os lábios carnudos. Certa vez beijou o rosto de seu Laerte na frente de Zezinho que levantou os olhos, virou o rosto e resmungou: Nossssssssssssssa!
A noite caindo, reunião próxima do fim. Um João, furioso, partia para cima de Laerte, enquanto este tombava a cabeça para trás, fazendo ploc, ao colidir com o chão. Dr. Álvaro acudiu o moribundo. Na palma de sua mão esquerda uma foto. No fundo da foto um espelho onde surgia Paula, cerrando os olhos de prazer enquanto João, acima, posudo e vermelho, sorria. Ao ver sua esposa, Dr. Álvaro se enraivou e lá foi de novo a cabeça de Laerte rumo ao chão. O pobre médico , descobrindo-se corno, levantou-se rapidamente e saiu apressado a procura de João. Ninguém soube dizer o que houve depois. Na portaria, apenas Zezinho refletia: nosssssssssssssssa!
Por: Henrique Biscardi
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