sexta-feira, 18 de novembro de 2011

THAIS E O VETUSTO

Atravessou o mar esperando encontrar algum refúgio, algo que lhe encantasse. Porém, logo percebeu que a fuga não havia sido uma boa escolha. Procurou e não encontrou razão para estar ali. Em seus olhos, sua alma em frangalhos. Pelo horizonte escorria, água, água e água. Estava difícil enxergar a terra. Ela perecia, cada vez mais, distante...menos firme. 

Quanto mais fustigava seus desejos, crescente era a sua febre. Talvez – pensou - não fosse uma lebre indefesa, presa num covil, a espera de seu algoz.  Talvez nem fosse grande a sua espera. Talvez. A incerteza, porém também a consumia. Mais do que a espera.

Sobre a espera, ela lembrou: durou uma semana inteira!  Telefonou, mandou e-mail, passou mensagem. - Estou ocupado, depois te ligo – Aquilo não era resposta! – Indignou-se. Ela queria mais. Queria entrega. Desejava que ele a desejasse tanto quanto ela o desejava. Seu cheiro, seu corpo, seu querer estar junto.

Foi quando algumas palavras laminaram o seu peito. Ele dizia querer estar junto. Dizia que pensava nela o dia inteiro e aquilo era tão especial, algo tão inédito em sua vida. Thais sorriu com desdenho. Achou até charme no jeito com que ele dizia aquelas mentiras doce.  Entretanto, sem razão, em um dia qualquer, ela acreditou.

Aceitou seus gracejos, confiou em seu olhar. Atravessou metade da cidade num engarrafamento para estar com ele um par de horas. Ficaram a noite inteira. Conversando e sorrindo. Apesar do desejo, não se enroscaram em camas ou lençóis. Amaram-se. Sim, amaram-se. Amaram-se na cumplicidade de suas histórias, de suas dores, em suas memórias.  Seus corpos e bocas desataram-se por vários momentos, irrompendo sobre um momento ou outro de desatino, de tristeza, de descompasso. Despediram-se algumas vezes, mas a cada distanciamento, uma outra força os reaproximava.  E o dia, amanheceu. A semana passou. Rogério, sumiu.


Thais pensou que o silêncio jamais poderia dizer mais do que mil palavras e isso a consumia. A menina, então, já não saía. A música era sua única companhia e fonte de energia. Percorreu desertos que não conhecia em sua alma, buscou abrigo onde não existia, desbravou mares cujas correntes lhe jogaram de um lado ao outro de sua solidão.

Atravessou o mar esperando encontrar algum refúgio, algo que lhe encantasse. Depois de duas semanas, voltou ao Porto. Pegou o celular e ligou?

- Thais! Por onde andou, meu amor?  Tentei deixar mensagem no seu celular, mas não consegui.

- Rogério, só liguei para dizer que eu te perdôo. Eu te perdôo, Rogério.

Thais interrompeu a ligação e jogou o celular no mar. Aquilo, para ela, havia ficado muito vetusto. 

Por: Henrique Biscardi

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

INTERVALO

Eu não quero ter essa conversa tola.
Você não percebe?
Esse controle remoto que você chama de poder.
É....sei lá...uma defesa minha.
Você sabe...homem é mais fechado, não gostamos mesmo muito de falar, principalmente de nossos sentimentos.
O que eu posso fazer? Nós somos assim.
Somos mais fechados. É nossa natureza!
Fazer o quê?

Hã?
Mas é claro que eu gosto de você, amor.
Claro que gosto!
Olha, deixa eu te contar uma coisa.  
Sabia que nem de futebol eu gosto?
Não gosto, não. É verdade.
Eu vejo porque não há mais nada de interessante para se ver na TV, estou a toa, sem fazer nada. Mas eu não deixo de fazer nada para ver futebol. É ruim, hein. Se eu tiver que sair, eu saio. Se tiver que fazer outra coisa, eu faço. 
O que por exemplo?
Sei lá, Thais. Cada idéia. Agora, assim, na lata, eu não me lembro de nada, mas é lógico que eu já deixei de ver o jogo para fazer alguma parada. Está louca!

Quer ver só? Responda-me uma coisa...Que dia da semana eu jogo futebol com os amigos,hein!!!
Hein! Hein!!!
Nenhum,Viu? Nenhum. Se eu ligasse tanto assim para futebol, era natural que eu tivesse alguma pelada durante a semana para jogar com um grupo de amigos. Mas, eu não tenho. Saio do trabalho e venho para casa para ficar aqui, com você. 

E outra coisa.Você diz que eu não quero conversar, mas isso também não é verdade.
Você é que só quer conversar na hora do jogo
Podia ser na novela, mas não!!!
Tem que ser na hora do jogo
Podia ser na hora do filme, mas não!!!
Tem que ser na hora do jogo
Nem durante o programa da Hebe, você quer conversar
Não, não. Só na hora do jogo.

Hei , hei , espera aí,
Pra que essa mala?
Como assim, Thais?
Espera, olha...está passando futebol e  Eu estou aqui...com você. Viu? Senta aqui, vamos conversar.
Não? Você quer ir?
Mas, por que?
Saco cheio, saco cheio, Isso lá é jeito de falar com o seu marido,Thais?
Futuro ex?
Como assim. Peraí , meu amor. Não faz assim, vai
Venha cá, venha...

Está bem, está bem, já te soltei. Quer ir, vai. Mas, vai para onde?
Não me interessa? Claro que me interessa. Eu sou seu marido.
Que negócio é esse?  Para com isso
O seu lar é aqui. Pára com isso, vai . Vem cá, me dê um abraço aqui, vai
Isso!!! Eu te amo, sabia?

Não, não chora
Venha cá,
Isso...me abraça.
O que foi isso, hein!!!
Você sabe que eu te amo...
Amo sim...verdade!!!

Não Thais! Calma, calma
Senta aqui, vamos conversar
Calma, calma, eu não esotu te enrolando, a gente só está conversando!
Você não queria conversar?
Faz o seguinte, então, ó
Fica essa noite na casa da sua mãe
Converse com ela, pensa bem, se acalme
Amanhã, a gente senta e conversa
Que tal? O que você acha?
Gostou da idéia, né?
Se eu te levo?
Claro que eu te levo...
Senta aqui, respira, se acalma
Deixa só dar o intervalo aqui,  que eu já te levo.




Por: Henrique Biscardi

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

THAIS E A CAMISA AUTOGRAFADA DO WASHINGTON

Abriu os olhos e desejou enrolar-se ainda mais naqueles lençóis. O sol entrava num curto espaço entre o batente das janelas e a cortina. Era possível ver que ele brilhava, como os olhos de Thais que, naquele momento, desejava um delicioso café da manhã e um mimo de seu novo namorado. Pensou que seria bom um beijo de "bom dia" na testa e na bandeja, suco, iogurte, granolas, frutas e cereais.

Marcelo estava em frente ao espelho. Tirou a camisa e com a calça de pijamas parecendo uma roupa ninja ameaçou alguns passou de Tai chi. No início, Thais até achou alguma graça. O rapaz, porém, empolgou-se e começou a ver músculos onde os mesmos não existiam. Passou as mãos sobre os cabelos e tentou inflar o peitoral. A pior parte foi fazer simulações, em frente ao espelho, de sua performance na noite anterior. Isso sim, deixou Thais perplexa e indignada:

- Mais o que é isso?

- Isso, o que?

- Essa coisa ridícula.

- Ridícula hoje, né? Ontem à noite você bem que gostou.

Thais sabia dos riscos de pegar qualquer um, em qualquer lugar. Suas amigas também já a haviam alertado – Tai, hoje 90 % dos homens são babacas. Pouco mais de 9 % são legais, mas já estão casados ou comprometidos. Nos sobra então, menos de 1% amiga!! isso é quase nada!!! Cuidado, amiga! E nada de levar homem para casa, hein !

Esse último conselho a menina ouviu. Foi para a casa do rapaz. A questão agora era, como sair de lá:

- Eu estou falando disso aqui, dentro de seu armário. Que porra  é essa, Marcelo?

- É a camisa do Washington, meu amor. Eu já havia lhe falado sobre ela.

- Quem é Washington?

- Washington, meu anjo. Aquele atacante do Fluminense. Aquele, lembra-se? O cara teve um problemão no coração, ficou um tempo parado e depois, deu a volta por cima, foi campeão...lembra-se?

 - Não.

- Washington, amor. Aquele que jogava no Fluminense!

- Porra! Marcelo, tu não é rubro-negro? Que camisa é essa do Fluminense dentro de seu armário?
- Qual o problema?

- Qual o problema? qual o problema?

Thais pegou a camisa e cheirou

- Porra!!! Está fedendo para cacete essa porra! Bem que eu estava sentindo esse cheiro desde ontem.

- Claro! É a camisa do jogo! Ele me deu de recordação. Ele é meu parceiro. Tirou do próprio corpo e me deu .

- E vc acha isso legal, Marcelo. Que porra de  homem você é que guarda a camisa de outro marmanjo no armário sem lavar, Marcelo. Você quer o que? Quer ficar sentindo o cheirinho dele?  E essa porra que você estava fazendo em frente ao espelho, Marcelo? Que coisa ridícula era aquela?  Você é gay, Marcelo? Você é gay? 

Thais sabia que gay Marcelo não era,  mas aquele malabarismo em frente ao armário extinguiu a chance daquela relação ir adiante. Para Thais, Marcelo não era gay, era ridículo e isso era muito pior. Se tem uma coisa que Thais jamais suportou foi homem ridículo.

O clima entre os dois ficou pesado. Marcelo olhava fixamente para o teto, tentando entender o que se passava na cabeça de Thais. A moça vestiu-se rapidamente, pegou a mochila e disse adeus.  No hall de entrada do prédio, Thais parou e refletiu:

- Putz! A camisa do Washington...autografada! perdi. 


Por: Henrique Biscardi